O atual declínio da educação brasileira se manifesta em cortes de livros didáticos, investimentos ínfimos e resultados alarmantes no PISA
Caros leitores, nosso país marcha, a passos largos, rumo ao colapso em diversos setores. Neste ensaio, trago ao centro da reflexão o que considero o mais alarmante de todos: o esfacelamento da educação brasileira. O Estado, sem qualquer pudor, abdicou de vez do compromisso com o saber. Em um jogo perverso de negligência e cinismo, quem suporta o peso dessa derrocada são os jovens, que veem seu horizonte de possibilidades ser metodicamente desfeito.
Não vamos nos aposentar, tampouco estudar. Seremos condicionados apenas a achar: achar que sabemos, achar que temos algo além da miséria intelectual, moral e sistêmica. Somos um povo marcado.
O Ministério da Educação acaba de anunciar que, a partir de 2026, cessará a aquisição de livros didáticos de história, geografia, ciências e artes para o ensino fundamental, evidenciando uma crise sem precedentes na já combalida educação pública nacional. Para mim, isso não causa estranheza alguma. A inércia estatal, nesse campo, é apenas mais uma página de um velho livro mofado de omissões.
Contudo, para muitos, a notícia ecoa como um murro seco no estômago, especialmente àqueles que ainda alimentavam alguma esperança de que o governo demonstrasse mínima responsabilidade com o futuro do seu povo. Mas sejamos francos: isso jamais existiu. A justificativa? A mesma retórica gasta de sempre: não há verba, falta caixa.
Algo, porém, não se encaixa. Apenas nos seis primeiros meses de 2025, o governo federal arrecadou a cifra recorde de R$ 1,425 trilhão. Pergunto, então: para onde escorre tamanha fortuna?
Enquanto milhões de crianças brasileiras não conseguem articular uma frase com clareza aos 10 anos de idade, o governo esbanja bilhões em publicidade institucional. Já reparou na televisão aberta? Nos anúncios patrocinados nas redes, nos vídeos do YouTube com gatinhos falantes e slogans marqueteiros? Lula em plena campanha pré-eleitoral disfarçada, com um exército de mídias sociais a todo vapor, pavimentando a ilusão.
Tudo isso custa, e custa muito. E custa com o nosso dinheiro. Simultaneamente, o Congresso Nacional é abastecido com cifras astronômicas via emendas parlamentares, apenas para assegurar que nenhum aliado ouse contrariar o soberano. O poder executivo, por sua vez, continua sustentando vultosos benefícios fiscais a grandes conglomerados, corporações privilegiadas, lobbies organizados e bilionários que há décadas se alimentam do Estado como parasitas bem acomodados.
A classe política, por outro lado, se blinda com requintes cada vez mais luxuosos. Seus privilégios são ampliados ano após ano, quase sempre encobertos por sigilos centenários. Em suma, meu caro, dinheiro não falta, o que falta é vontade política e senso de prioridade.
Enquanto isso, as escolas públicas desmoronam (literalmente). Os professores clamam por socorro em meio ao caos. E o desempenho dos alunos brasileiros em avaliações internacionais é um espetáculo de vergonha. E o que faz o governo? Corta livros. Sim, livros. Porque é mais vantajoso manter o povo na ignorância do que educá-lo. Quanto menos o povo compreende, mais barato se torna seu voto.
Não por acaso, as disciplinas extirpadas são justamente aquelas que cultivam o pensamento crítico. E quem sofre ainda mais? Acertou quem pensou nos professores, já sobrecarregados, agora também mutilados em sua missão de ensinar.
Quanto mais rasa a base da pirâmide, mais inabalável o topo da corrupção. O que se desenrola diante de nós é a sequência lógica de um projeto que exige uma população obtusa, dependente e subserviente para que a elite corrupta siga reinando. É revoltante constatar que parte expressiva do corpo docente universitário (ironicamente a elite do saber) defende cegamente o mesmo governo que sabota o próprio alicerce do conhecimento.
Embora o saber amplie horizontes, ele não garante libertação. Uma mente cultivada pode ainda assim ser cativa de ideologias, principalmente quando estas oferecem o conforto da conveniência.
Um povo instruído enxerga com clareza a manipulação midiática, reconhece a corrupção em seus múltiplos disfarces e não esquece o passado recente. Já um povo ignorante, amedrontado e vulnerável aceita qualquer migalha em troca de silêncio.
O que está acontecendo é um retrocesso grotesco. Compromete-se a equidade no acesso ao livro didático, inviabiliza-se o planejamento pedagógico, sabota-se a continuidade do processo educativo. E por que a escassez de recursos para a educação? Porque o governo tem, de forma sistemática, reduzido seus investimentos na área. Aliás, nem deveria se chamar de “gasto” – é investimento. Ou melhor: seria, se não fosse deliberadamente canalizado para a construção da ignorância nacional.
A estimativa é que a educação brasileira perderá R$ 42,3 bilhões até 2030. Relatórios da OCDE escancaram: o Brasil figura entre os países que menos investem por aluno. Nosso país gasta, por estudante, apenas um terço do valor aplicado pelas nações desenvolvidas.
É simples: o Brasil não quer competir com os grandes. Não quer se igualar às potências. Não quer tornar-se uma nação desenvolvida. Como fazê-lo, afinal, se não investe em capital humano?
Não existe país próspero sem uma população bem formada. É fato comprovado: educação não é custo: é alicerce.
Na liderança dos países da USD, está a Islândia, que destina 7% do PIB à educação. Em seguida vêm Suécia, Noruega, Finlândia, Dinamarca. Até o Chile investe acima dos 6%. E o Brasil? Em penúltima colocação, com míseros 4,2%, e caindo ano após ano. Não por acaso, também amargamos os últimos lugares no ranking global do PISA, principal avaliação internacional de desempenho escolar.
A Coreia do Sul, devastada por uma guerra nos anos de 1950, transformou-se em potência tecnológica em quatro décadas. Como? Com educação em tempo integral, disciplina, valorização docente e formação contínua.
Singapura, sem recursos naturais, transformou seu povo no principal ativo nacional. Fez isso com um ensino rigoroso, voltado à ciência, à tecnologia e ao pensamento crítico. O mesmo vale para Finlândia, Japão, Canadá, Austrália. Todos esses países têm algo em comum: tratam a educação como política de Estado, não como barganha eleitoral.
Não há milagre econômico sem gente qualificada. Enquanto isso, o Brasil se apega a narrativas ideológicas, corta livros de ciência, história e artes, como se isso representasse alguma economia real. Não economiza: destrói. O que se perde, de fato, é o capital intelectual da nação.
E você, sinceramente, acredita que um país competitivo se constrói apenas com Bolsa Família? Com publicidade institucional?
É evidente que não. Constrói-se com escolas reais, com ensino de qualidade, com professores respeitados e com investimentos onde realmente importa.
Alegam não haver dinheiro para a educação, mas sobram bilhões para outras prioridades. Apenas em 2025, o governo Lula empenhou R$ 3,8 bilhões em emendas parlamentares. E esse número tende a crescer exponencialmente, pois trata-se de um ano pré-eleitoral. Na realidade, o valor reservado para emendas em 2025 ultrapassa os R$ 58,4 bilhões.
Vejam, leitores: cortam da educação, mas aumentam os privilégios da elite política. Apenas com publicidade institucional, para polir a imagem do governo (ou enganar os brasileiros), houve um aumento de R$ 3 bilhões.
O que está ocorrendo não é um mero ajuste orçamentário. É a semente de uma calamidade silenciosa, que custará mais caro do que qualquer déficit fiscal ou crise de governabilidade. Um país que abandona suas crianças está deliberadamente sepultando o próprio futuro.
Hoje falta um livro. Amanhã, faltará um profissional. Depois, um empreendedor. E, por fim, um voto lúcido. Sem educação, não há produtividade. Sem produtividade, não há desenvolvimento. Sem desenvolvimento, não há trabalho. E sem trabalho, não há nação.
A próxima tormenta que assombrará o Brasil não será apenas de números e déficits. Será uma falência do espírito, um colapso da razão, um abismo do qual talvez não haja retorno.
Quando o Estado escolhe a ignorância como política, ele não apenas deseduca: ele molda consciências subservientes. Ao suprimir o pensamento crítico, elimina-se a dúvida, e onde não há dúvida, a tirania se disfarça de salvação. É nesse terreno infértil da razão que o absurdo floresce, e com ele, a barbárie. Como já advertira Voltaire: “Aqueles que podem te fazer acreditar em absurdos podem te fazer cometer atrocidades.”
1. Por que História, Geografia, Ciências e Artes são as disciplinas mais afetadas?
A escolha não é aleatória. Essas matérias cultivam pensamento crítico, consciência cidadã e capacidade de questionamento – habilidades perigosas para governos que dependem de narrativas controladas. Enquanto Português e Matemática são vistos como “utilitários”, disciplinas como História revelam padrões de poder, e Ciências desafiam dogmas. Um exemplo emblemático: em 2021, o MEC já havia tentado retirar termos como “ditadura militar” dos livros, substituindo por “regime militar”.
Dados do PISA 2022 mostram que alunos com acesso a essas disciplinas têm 28% mais chances de identificar fake news. Sem elas, a formação fica técnica e acrítica, ideal para mão de obra barata, mas não para cidadãos autônomos.
Fonte: Relatório PISA 2022 – OECD
2. Quanto custa NÃO investir em educação?
O governo alega falta de verba, mas o custo da ignorância é astronômico. Estudos do Banco Mundial indicam que cada 1% a menos em investimento educacional reduz o PIB per capita em 2,5% em 10 anos. No Brasil, onde já se gasta apenas 4,2% do PIB (contra 7% na Islândia), a conta é clara:
- Perda de produtividade: Profissionais sem formação adequada geram R$ 1,3 trilhão a menos até 2035 (IPEA).
- Criminalidade: Jovens sem acesso à educação têm 3x mais chances de entrar para o crime (FBSP).
- Dependência do Estado: Para cada R$ 1 cortado na educação, gasta-se R$ 7 em programas assistenciais futuros (FGV).
Enquanto isso, R$ 58,4 bi são destinados a emendas parlamentares em 2025 – o suficiente para comprar 480 milhões de livros didáticos.
Fonte: Banco Mundial – Impacto Econômico da Educação
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